terça-feira, 9 de abril de 2024

Entenda como a chuva provoca desastres

Deslizamento é processo natural em encosta, diz especialista
Foto: Divulgação | Prefeitura do Rio de Janeiro

Salvador está em alerta máximo por causa da ocorrência de temporais, que levam à população o temor de deslizamentos e desmoronamentos. Na manhã desta terça-feira, 9, parte de um prédio de três pavimentos desabou em uma encosta no bairro de São Caetano. Segundo a Defesa Civil da capital baiana (Codesal), não havia pessoas no local no momento do acidente.

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Desde a madrugada da última segunda, 8, a Codesal registrou mais de 370 ocorrências relacionadas às fortes chuvas que atingem a cidade há quatro dias. Entre elas, estão o alagamento de um túnel na avenida Pinto de Aguiar e o desabamento do teto de um terreiro de candomblé no bairro Cajazeiras 7. Foram mais de 100 registros de deslizamentos de terra. 

As chuvas intensas fizeram com que a Codesal acionasse as 14 sirenes do Sistema de Alerta e Alarme instaladas em áreas de risco prioritárias na cidade. As sirenes são acionadas quando são registradas chuvas fortes acima de 150 mm em 72 horas. A medida prevê que os moradores das localidades sejam conduzidos a uma unidade de acolhimento localizada em escolas, onde ficam abrigadas até que não haja mais risco. Cerca de mil pessoas tiveram que sair de suas casas.

Em entrevista à Agência Brasil, especialistas explicam, tecnicamente, como a ocorrência de fortes chuvas afeta o solo e pode causar desastres. O profissional geotécnico Marcos Barreto de Mendonça, professor da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), escalreceu que deslizamento “é um processo natural, é a evolução natural das encostas. O problema é o ser humano estar exposto.”

Pressão no solo

O professor detalha que os terrenos são porosos. Durante as chuvas, parte da água é escoada para a rede pluvial e parte se infiltra no solo. “O solo fica lá na encosta paradinho, o que a gente chama de encosta estável, porque o solo é resistente, ele fica estável. Quando a água se infiltra, a pressão aumenta. Isso é normal, infiltra-se e vai alimentar os aquíferos, que são os lençóis d’água. Esse é o processo natural, faz parte do ciclo hidrológico”, pormenoriza.

“Mas, se aumentar muito a quantidade de água se infiltrando no terreno, pode gerar uma pressão tão grande que vai fazer com que o solo perca a resistência e deslize”, complementa. Mendonça acrescenta que, em regiões onde há habitações, a situação se agrava. “O problema é a forma como a sociedade se organiza no território, que expõe a população a essas ameaças de deslizamento.” 

Ele critica a falta de infraestrutura em regiões notadamente ocupadas pela população mais pobre, como favelas. “Se eu não tenho nenhum sistema de drenagem superficial para coletar essa água e direcionar rapidamente para o pé da encosta, o que vai acontecer é que mais água vai se infiltrando no terreno. Então essas áreas que são desprovidas de infraestrutura são mais suscetíveis a deslizamentos”, explica.

Além disso, o próprio esgoto sanitário dessas comunidades, não coletado de forma correta pela infraestrutura urbana, acaba contribuindo para o aumento de pressão da água no solo. “O esgoto é como se fosse uma chuva antrópica, ou seja, o homem que está provocando essa infiltração de água, e não a natureza”, afirma.

Segundo o professor Mendonça, as áreas mais suscetíveis a deslizamentos são as regiões montanhosas. De acordo com Mendonça, a região com morros é um importante ponto de atenção, apesar de as principais intercorrências causadas por temporais serem inundações.

Baixa renda

O professor entende que condições socioeconômicas “pressionam” populações mais pobres e vulneráveis a habitar essas áreas, deixando-as expostas a riscos aumentados de desmoronamentos.

A opinião é compartilhada pela pesquisadora Thêmis Aragão, do Observatório das Metrópoles – um instituto nacional de ciência e tecnologia ligado ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Thêmis cita, por exemplo, vários pontos de alerta no Complexo do Alemão, conjunto de favelas na zona norte do Rio de Janeiro, e vê gravidade também na região serrana, onde qualquer expansão da população esbarra nas condições geográficas dos municípios. “Para onde a mancha urbana se expande, estará se expandindo por áreas íngremes”, ressalta.

Para a pesquisadora, o problema tem se agravado ao longo dos anos por questões demográficas, isto é, pelo aumento da população. A pesquisadora do  Observatório das Metrópoles chama a atenção para lacunas na atuação do poder público em relação a moradias.

“A ocupação irregular vai acontecer principalmente pela falta de política pública de habitação. O Estado não pode ficar ao largo dessas questões porque, de uma maneira geral, os territórios vulneráveis são resultados da ausência do Estado”, avalia Thêmis, que também vê falhas na infraestrutura dessas localidades.

“A gente tem tecnologia e engenharia que possa lidar com esse risco, mas você tem que ter uma política pública de monitoramento e uma agenda para promover essa infraestrutura, esses muros de contenção, a parte de drenagem”, conclui.

*Com informações da Ag. Brasil

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